Nos últimos meses de dezembro de 2010 e janeiro de 2011 realizei uma viagem que há muito tempo planejava fazer. O destino era incomum, pelo menos para a maioria das pessoas que eu conheço: o Oriente Médio e Norte da África. O planejamento era economizar tempo e dinheiro na jornada que incluiria Israel, Palestina, Jordânia e Egito. Mochila com mais ou menos 10kg nas costas e mais o equipamento fotográfico e um computador. Nos lugares, tentar sobreviver e me transportar, na medida do possível, como os habitantes locais. Depois, relatar e mostrar as experiências aqui, seguindo a ordem cronológica da viagem. A primeira parte deu certo e consegui voltar ileso pra contar a história, mas a segunda parte não saiu muito como o planejado. Até hoje não consegui domar a quantidade de fotografias e os fatos que se seguiram, alteraram a minha disposição de seguir aquela narrativa cronológica. Assim, começo falando dos dias finais da viagem, quando estive no Egito, país que está nas manchetes no mundo inteiro há mais de uma semana.
Cheguei ao Egito através da Península do Sinai e cada vez que fui me aproximando da capital uma sucessão de ocorrências, digamos, incomuns a um viajante normal, tornava a estadia no Egito por vezes desagradável. No Cairo parecia que essas dificuldades aumentavam e muito de proporção. Confesso que algumas vezes cheguei a ter inveja dos turistas empacotados que conseguem chegar em casa contando maravilhas das Pirâmides de Gisé, de um passeio no Nilo ou que nunca tiveram que atravessar a pé uma avenida na capital. Mas falar dessa ou outras cidades do Egito será assunto para outros posts aqui no blog. Agora, o que mais interessa agora são as pessoas que vivem naquele lugar e que são mostradas como multidões de milhões foram para as ruas após, de repente, acordarem de um pesadelo de 30 anos.
Na portaria de um hotel no Cairo encontrei alguém que desatou o falatório: “Quero ir embora desse país. Não aguento mais essa gente desonesta, essa confusão, desordem…” O cara ia falando e eu concordando, lembrando que até aquele momento, tinha passado por vários episódios que me faziam também testemunha daquele festival de reclamações. Desde o serviço de informações do aeroporto que jurava que não existia transporte público até a cidade, para em seguida tentar te fazer uma venda casada de transfer e hospedagem em hotéis, até os malfadados taxistas que te abordam na rua falando um inglês razoável e, quando você entra dentro do carro deles – que jamais tem taxímetro- , num passe de mágica esquecem a língua e você descobre que embarcou numa viagem possivelmente para o inferno. Lembrei também dos policiais que somente assistem ao caos das ruas, já conformados com sua condição de inutilidade social e também da imensa quantidade de camelôs nas ruas, exagerada até para uma cidade de 8 milhões de habitantes, revelando uma massa desempregada jogada no vale-tudo pra sobreviver. Aí eu já ia só balançando a cabeça e concordando com a ladainha daquele recepcionista.
Só que o detalhe era que ele não era um visitante chateado com um país que tinha tudo pra ser apenas fascinante, mas acumulava uma sucessão de decepções. Quem reclamava da vida era justamente o recepcionista do hotel, um cara que passava dos 30 anos e creio que quase todos eles sem a menor esperança de ver a situação do seu país melhorar. De longe, olhava pra nós o superior dele. Se afastou quando a conversa começou, mas não parecia reprovar. Não tenho dúvida alguma que o recepcionista esteve nas ruas todos esses dias que houveram protestos. Como ele, também estavam lá várias outras pessoas que vi, ou de certa maneira conheci, percorrendo o Cairo, sempre o mais longe possível das ruas que eram reservadas para enganar os turistas, onde o cidadão local não é (ou era) muito bem vindo.
As imagens nesta página mostram a cara das pessoas do Cairo fora da multidão, no que era o seu cotidiano até os dias finais de janeiro de 2011.
grande e querido amigo
mais que oportuno
no tempo e no lugar certo
belo ensaio
ainda faremos isso juntos
abraço grande
Léo, acho que quando a gente tem oportunidade de ler/ver essas histórias, a gente se sente menos bitolado no nosso mundinho, lembra que não é o centro do mundo né? Seu relato está belíssimo. Eu quase pude ouvir a voz do recepcionista, sentir o cheiro do pão e doces do vendedor ambulante e ouvir as risadas das tímidas mulheres e das crianças.
Suas fotos tem vida, parecem ter som.
muito bom. fodaço.
Valeu, pela visita, Rei poético das alcovas alagoanas.
Você está impossível mesmo!
Mais uma viagem contigo.
Agradeço imensamente este passeio.
Abraço
Adriana
Tia Drica,
Obrigado pela visita ao humilde blog.
Já que ninguém topa encarar comigo esses roteiros exóticos, ao menos me acompanha virtualmente.
MESTRE LEO,
VOCÊ ESTÁ CADA DIA MAIS SENSACIONAL.
BELISSIMAS FOTOS, COM TEXTURA E QUALIDADE INTERNACIONAIS.
PEDRO LUIZ JÁ TINHA FALADO COM ENTUSIASMO DESTE SEU TRABALHO. ESTAVA QUERENDO VÊ-LO. AGORA ISTO ESTÁ RESOLVIDO. PARABÉNS.
PELO QUE JÁ VI -E APLAUDI- VALE UMA EXPOSIÇÃO DESTA E DE OUTRAS EXPERIÊNCIAS PESSOAIS E PROFISSIONAIS.
UM ABRAÇÃÃÃÃÃÃO
DO MARCIO CANUTO.
Colossal Mestre,
Obrigado pela vinda até aqui o Oriente Curto.
O que me frustrou um pouco nessa última viagem foi que a galera do Egito só esperou eu botar os pés fora de lá arregaçar com tudo. Quando eu estava naquele país, senti um clima de ebulição, mas pensei que era uma coisa normal e constante, principalmente no Cairo, que é o exemplo acabado do caos urbano. Só foi um engraçadinho dar a ideia num país vizinho que a panela de pressão estourou.
Abração.
Fotos bacanas, amigão.
Texto dá vontade de estar presente
na aventura.
Abraço.
Hermann
Não foi por que não quis.
Falta de convite não foi o motivo.
Se prepare para a próxima. Talvez em 2012, ou em qualquer edição extraordinária.
Parabéns. Um belo registro.
Léo, você quase pega a revolta popular contra o regime de escravidão vigente no Egito. Caso estivesse por lá, teria presenciado um movimento da importância, para o Oriente Médio, que teve para a Europa a queda do muro de Berlim. Contudo, você capturou o instante dramático e histórico que precede a explosão. Conseguiu imprimir uma forma artística e um explícito conteúdo de solidariedade nas imagens. Vejo em suas imagens uma civilização de mais de seis mil anos vivendo, hoje, como a civilização ocidental vivia em fins do século XIX. São imagens densas, arrebatadoras, reveladoras do ódio dos poderosos pelos seus patrícios e do que sobrou de amor e amizade permeando as relações sociais naquele lugar. Você construiu um libelo contra a impunidade e o abandono das populações pobres do mundo à sua propria sorte. Fotojornalismo internacional, com destino certo: galeria de arte. Viva o bravo povo Egípcio!!!!!!!!
Luis Eduardo Vaz
Vaz,
As suas palavras sempre dão um ar de grandiosidade que nem sei se realmente são a medida do meu trabalho. Mas, como é você que tá falando, não sou eu que vou discutir.
Grande abraço.
Maravilha, Léo, como sempre, arrasou nas fotos e os textos estão na medida também.
Grande abraço!!!
Valeu, velho!
Estou embarcando agora pra o Quiprocó
Léo,
A gente vê as notícias mas não assimila muito bem. É tudo tão distante e impessoal. Seu trabalho nos deixa próximos a essas pessoas, humaniza as notícias. Vou acompanhar os acontecimentos com mais atenção a partir de hoje.
Gênios são as pessoas que pensam diferente do senso comum e apresentam novas perspectivas, uma nova forma de olhar o mesmo. Você é genial, eu sempre achei.
kisses
Pomps,
A genialidade na realidade está em saber que você é dono do seu destino. Tem gente que demora tempo demais pra descobrir isso. Às vezes o tempo de uma geração. Obrigado pelas palavras.
Quices.
Só tive tempo de ver com calma esse post hoje. 🙂 Lindíssimo. Fotos incríveis!
Renata,
Antes tarde do que mais tarde. Obrigado pela vinda.