“Assim é a vida”. Este é um dos escritos mais marcantes que se pode ler nas carcaças dos trens abandonados em Uyuni. A atmosfera desse cemitério ferroviário no Altiplano Boliviano provoca devaneios e transforma muitos dos que o descrevem em filósofos ocasionais. É a decadência e o abandono, dois dos maiores temores do ser humano, em forma bruta e eloquente.
O Cemitério de Trens de Uyuni foi o ponto final de um surto de progresso que tomou a Bolívia entre o final do século XIX e início do século XX. Nesse período, uma linha férrea foi concebida pelo presidente Aniceto Arce, que vislumbrava trens transportando as riquezas do seu país como o estanho, prata e ouro até Antofagasta, antiga saída boliviana para o Pacífico. Os ingleses se associaram nessa empreitada e, em 1892, estava finalizada a construção do empreendimento da Antofagasta and Bolivia Railway Companies.
A primeira oposição que a linha férrea sofreu foi dos índígenas Aymarás. Eles viam a ferrovia como uma ameaça à sua sobrevivência e a sabotaram continuamente. Ainda assim, os trens bolivianos prosseguiram em sua linha, despejando riqueza no terminal de Antofagasta e voltando carregado de gente que queria fazer a vida na Bolívia, nem sempre com as melhores das intenções. Esse movimento seguiu até anos 1940, quando a prata boliviana já tinha enchido suficientemente muitos bolsos de estrangeiros, que, àquela altura, decidiram que era hora de explorar outros lugares mais rentáveis. A Bolívia também perdeu sua saída para o mar, com isso, o ponto final dos trens dos sonhos de Aniceto Arce ficou sendo Uyuni – para sempre.
Muitos turistas que chegam até a região de Uyuni para visitar a sua maior atração, o Salar, uma das paisagens mais surreais do planeta, sequer sabem da existência do cemitério de trens. Passam a conhecer por que a primeira parada de quase todas as excursões que partem para o deserto de sal é o local onde os trens estão abandonados. Eu recomendo que se você chegar a Uyuni um dia antes da excursão ao Salar, vá até o Cemitério de Trens num fim de tarde, horário em que não há quase nenhum turista. Bom momento para formular sua própria teoria filosófica existencial.
VEJA A GALERIA DE FOTOS DO CEMITÉRIO DE TRENS DE UYUNI
Léo, é assim, que, aos poucos vamos desvendando o segredo da finalidade de nossas existências e abandonando o pressuposto de que não há finalidade alguma! Forte abraço. Vaz.
Vaz,
é bom que as pessoas descubram isso bem antes de chegarem no final da linha 🙂
Abração
Belas imagens do fim de um ciclo! seu olhar nos leva a imaginar como era antes e depois. No horizonte a luz que desenha nas ferrragens o que ficou no maior e absoluto esquecimento. Valeu!
Lêdo,
Minha satisfação é saber que há imaginação por trás do observador das fotos, pois pra mim a fotografia é apenas um indício do que aconteceu antes e depois dela. No caso desses trens, o antes pode se contabilizar em décadas. Obrigado pela visita e o olhar também contemplativo.
Abraço
Parabéns pelo texto. Excelente.
Estive na Bolívia recentemente e quando cheguei no cemitério de trens pensei algo muito parecido com o que você descreve. Aquilo era a síntese do que seus idealizadores menos desejavam: decadência e o abandono. Reflexo oposto ao objetivo inicial da estrada de ferro.
Estou escrevendo minha experiencia pela Bolívia e colei o link do seu post no blog (https://goo.gl/b5md7R). Gostei bastante, e suas fotos são incríveis.
Abs.
Olá, Ricardo.
Primeiramente, obrigado pela visita aqui ao site e à referência no seu blog.
Bom saber também que tem muitas pessoas tendo experiências incríveis nesse verdadeiro mundo a ser descoberto, que é a nossa América Latina.
Grande abraço!